Francisco Joatan Freitas Santos Júnior¹
(Texto 05)
Toda nova temática pode-se
comparar alegoricamente a um parto difícil. E, recorrendo à literatura
machadiana, também fará relembrar a indecisão de Brás Cubas em sua tarefa
póstuma: “Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou
pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha
morte.” (ASSIS, 2008, p. 21). Portanto,
não se nega o teor literário desse texto, logo, deve-se partir do princípio,
uma vez que não se trata de caso tão trágico.
Afora as narrativas
alegóricas, compreende-se a História pelo que dela fizeram os historiadores, ou
seja, pelos conceitos: passado, fato histórico, documentos etc., mas, nesse
texto, tentando não parecer rude, limitar-se-á ao conceito de passado.
O principal objeto de estudo
da História é o passado. Mas, o que se entende por
passado? Segundo Hobsbawm (1998, p. 37), “os historiadores
são o banco de memória da experiência. Teoricamente, o passado – todo o
passado, toda e qualquer coisa que aconteceu até hoje – constitui a História”. Seguindo o pensamento de Bloch (2001, p. 75): “O
passado é, por definição, um dado que nada mais modificará. Mas o conhecimento do passado é uma coisa em progresso, que
incessantemente se transforma e aperfeiçoa”. Um passado ainda “obscuro”,
sujeito a investigações, não fechado em conceito definitivo, ainda não
desvendado em sua constituição conceitual histórica, porquanto, é um objeto ímpar
e ávido para ser interpretado enquanto conhecimento pelo historiador.
O passado é inerente à
memória dos indivíduos e ao processo histórico das sociedades, no entanto, esse
passado por ele mesmo é um misticismo do presente. Esse passado ideal
desconhecido contempla em si os desafios que o historiador tem de se desfazer
em sua pesquisa, pois o passado em seu sentido histórico só pode ser a
expressão da vida social enquanto práxis humana no tempo-espaço.
Entretanto, qual a
importância real da vida social para a teoria histórica? Em Marx e Engels (2007, p. 539), ela aparece nas teses sobre Feuerbach como crítica ao
teoricismo metafísico: “A vida social é essencialmente prática. Todos os mistérios
que seduzem a teoria para o misticismo encontram a sua solução racional na
prática humana e no compreender desta prática”. No sentido geral, vida social
aparece como superação do misticismo e expressão racional do fazer-se
humano na prática, e na teoria histórica, torna-se fundamento da prática do
historiador.
Os conceitos de
passado, presente e futuro são categorias temporais e históricas difíceis de
serem isoladas uma das outras, senão de forma abstrata, pois estão imbricadas
na realidade histórico-cultural. Como retrata Fonseca (2014, p. 52): “Nossa opção historiográfica está
intimamente relacionada à nossa postura diante do mundo”. Essa passagem esboça
a influência da visão de mundo do historiador (no presente) sobre sua pesquisa,
situado pelas contradições internas das sociedades do presente, sob pressões
ideológicas das “lutas de classes”, que num processo invertido em direção ao
passado, mas nem por isso anacrônico, é capaz de compreendê-lo em suas
características próprias.
Dessa forma, o passado se revela objetivamente na
práxis social dos seres humanos historicamente condicionados e sob os termos organizacionais
de cada época, formando um elemento substancial e necessário para o entendimento
socio-histórico do presente, com desdobramentos futuros na vida social.
Entretanto, frequentemente o homem se rebela contra as leis da
História cientificista, como posto por Tolstoi (1959, p. 615): “Mas
o homem, que é o objeto da História, afirma categoricamente: eu sou livre, logo
não estou submetido a leis”. Na poesia como na vida, sob as condições materiais
e subjetivas posta, nada mais eficaz que uma rebelião para se construir algo
novo e se repensar os valores humanos.
Palavras-chaves: História, passado e práxis social.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ASSIS,
Machado de. Memórias póstumas de Brás
Cubas. Campinas: Editora Komedi, 2008.
BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício de
historiador. Prefácio Jacques Le Goff;
apresentação brasileira, Lília Moritz Schwarcz; tradução André Telles. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
FONSECA,
Selva Guimarães. Didática e prática de
ensino de história: experiências, reflexões e aprendizados. 13ª ed., rer. E
ampl. Campinas, SP: Papirus, 2014.
HOBSBAWM, Eric.
Sobre história. Tradução Cid Knipel Moreira. 5ª ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 1998.
MARX,
Karl; ENGELS, F.. A ideologia alemã: crítica da mais recente filosofia alemã em seus
representantes Feuerbach, B. Bauer e Stirner, e do socialismo alemão em seus
diferentes profetas. Tradução Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2007.
TOLSTOI, Léon. Guerra e paz. Tradução
de Gustavo Nonnenberg. 1ª ed. 6ª impressão. Rio de Janeiro, RJ: Editora Globo,
1959.
[1] Texto apresentado na disciplina
de Epistemologia das Ciências Sociais, ministrada pelo Prof. Dr. André Haguette
no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará - UECE.
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