sábado, 21 de maio de 2016

A DÉMARCHE DA PESQUISA

Francisco Joatan Freitas Santos Júnior¹
 (Texto 03)

Toda pesquisa científica parte do estudo de um fenômeno pouco conhecido em direção aos aspectos mais desconhecidos de um fenômeno, por isso, todo começo é um desafio. Nesse raciocínio, Bloch (2001, p. 67) considera que “a démarche natural de qualquer pesquisa é ir do mais ou menos mal conhecido ao mais obscuro”.
De fato, o começo de toda pesquisa social-científica é um complexo de incertezas. Marx (2013, p. 77), no prefácio à 1ª edição de O Capital sentencia: “Todo começo é difícil, e isso vale para toda ciência”. No entanto, pelo conjunto de sua obra, Marx deixou transparecer o “estado de espírito” de um investigador abnegado e que por toda a sua vida se dedicou a desvelar os difíceis liames do capitalismo. No mais, em relação a qualquer experiência de produção textual de Marx, o desafio desse texto é infinitamente menor.
Mas, quais os passos fundamentais de uma pesquisa social? Partindo da dúvida sobre seu próprio pensamento, Descartes (2000, p. 41), mentor da ciência moderna, afirma: “Penso, logo existo”. Outros partem dessa certeza numa sequência a moda cartesiana: objeto, problematização, hipótese, metodologia, relevância. Do ponto de vista ideal, alguns filósofos querem saber a “verdade” sobre si mesmo, o universo, um objeto qualquer. Talvez, o primeiro momento da ciência seja desafiar o senso comum e indagar sobre o que está por trás do óbvio.
Noutra direção, na tentativa de superar o idealismo em ciências sociais, a tradição marxista parte do pressuposto teórico-metodológico do materialismo histórico, considerando que a condição técnica para o progresso de qualquer trabalho científico, em termos dialéticos, é sempre vislumbrar a totalidade do real, numa relação que parte dos aspectos mais simples aos mais complexos e vice-versa.
O objeto de toda pesquisa social na perspectiva marxista situa-se historicamente num tempo e espaço determinado, compreendendo-se que “tempo e espaço são categorias construídas que se desenvolvem em determinado momento e espaço históricos” (MAIA FILHO et al., 2014, p. 9). A tradição marxiana, grosso modo, parte do pressuposto de que as bases econômicas da sociedade, sob a égide do sistema mundial produtor de mercadorias, são fundamentais na análise de qualquer objeto de estudo. Portanto, conforme o contexto sócio-histórico, o objeto de estudo e os objetivos da pesquisa, e nos limites de tempo exigido, as categorias de análises próprias da pesquisa social podem ser o próximo passo a ser explicitado por um pesquisador.
Do ponto de vista epistemológico, subtende-se, a priori, que a ciência investiga uma realidade objetiva apoiada numa reflexão filosófica, e provavelmente, utiliza-se de procedimentos metodológicos rígidos na tentativa de apreensão da realidade concreta pelo pensamento abstrato. Emir Sader diz, na apresentação do clássico livro A Ideologia Alemã, que a “busca do conhecimento e da verdade pelo pensamento humano partiu sempre da dicotomia entre sujeito e objeto” (MARX; ENGELS, 2007, p. 9). Mas, como superar essa dualidade metafísica? Como perceber o movimento real entre sujeito e objeto? A superação dessa dicotomia continua sendo uma questão posta a todos os grandes filósofos.
O viés epistemológico que discute a relação entre sujeito e objeto, a determinação da matéria como anterior ao espírito, ou vice-versa, ergue-se como “campo de batalha” por excelência do pensamento filosófico, por ser o espaço de reflexão sobre o caráter e a natureza da realidade. Mesmo após a dialética recuperada por Hegel e depois “invertida” por Marx, a relação epistemológica entre matéria e espírito continua sendo um problema filosófico cheio de controvérsias e de quase nenhum consenso.
Palavras-chaves: Pesquisa, objeto e epistemologia.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BLOCH, Marc.  Apologia da história ou o ofício de historiador.  Prefácio Jacques Le Goff; apresentação brasileira, Lília Moritz Schwarcz; tradução André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
DESCARTES, René. Discurso do método: regras para a direção do espírito. Tradução de Pietro Nassetti. São Paulo: Editora Martin Claret, 2000.
MARX, Karl; ENGELS, F.. A ideologia alemã: crítica da mais recente filosofia alemã em seus representantes Feuerbach, B. Bauer e Stirner, e do socialismo alemão em seus diferentes profetas (1845-1846). Supervisão editorial Leandro Konder; tradução, Rubens Enderle, Nélio Schneider, Luciano Cavini Martorano. São Paulo: Boitempo, 2007.
MARX, Karl. O capital - crítica da economia política - Livro I: o processo de produção do capital. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013.
MAIA FILHO, O. N.; Chaves, Hamilton Viana; Ribeiro, Luis Távora Furtado; Sousa, Natalia Dias de Sousa. O impacto da aceleração tempo-espaço nas relações de produção. – In: Cadernos de Pesquisa, São Luís, v. 21, n. 2, mai./ago. 2014. Disponível em: <http://www.periodicoseletronicos.ufma.br/index.php/cadernosdepesquisa/article/view/2768/1570>. Acesso em: 18/maio/2016.

[1] Texto apresentado na disciplina de Epistemologia das Ciências Sociais, ministrada pelo Prof. Dr. André Haguette no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará - UECE.

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